segunda-feira, 31 de janeiro de 2011



Quando eu era criança andava com uma menininha que era um porre, mas não tinha muita escolha. Não era eu quem escolhia minhas amizades, e segundo meus pais ela era a menina certa para andar comigo. Eles julgavam as outras crianças da quadra como más companhias. Ela era cruel. Por exemplo, um dia ela ganhou um lego, daqueles super phynos que depois de pronto, tínhamos a impressão de que o dragão sairia voando de verdade de dentro do castelo. Estávamos brincando embaixo do prédio, quando o porteiro chegou perto e ficou olhando para o brinquedo, talvez pensando "Será que é caro? Será que posso comprar um para os meus filhos?". Na mesma hora, Fernanda disse do alto de sua honra elitista: "Está olhando o que idiota? Sai daqui!". Eu deveria ter uns 7 anos, mas me senti mal com a atitude da garota, e de certa forma culpada por estar ali brincando com o lego dela, enquanto os filhos do porteiro não poderiam nem chegar perto.

Fernanda dizia que adorava passar trote por telefone. Um dia me confessou que ligou para uma pizzaria e pediu duas pizzas grandes, e mandou entregarem no endereço X. Quando argumentei que isso era errado, ela começou a rir de forma bastante maldosa. Disse que eu não sabia me divertir, que eu deveria parar de ser chata. Aonde diabos meus pais estavam com a cabeça por me deixarem andar justamente com ela? Tenho certeza que os filhos do porteiro tiveram educação melhor. Talvez qualquer outra criança da mesma quadra, ou até mesmo os maconheiros que ficavam a noite no parquinho.

Me mudei e só encontrei Fernanda depois uma vez na sorveteria. Ela ainda mora na mesma quadra, no prédio do meu melhor amigo. Não sei o que aconteceu com ela, se hoje é uma boa pessoa ou se continua a mesma menina mimada de sempre. Também não me interessa saber. A convivência com Fernanda na infância foi tão insignificante que  só me lembro de suas maldades e da viagem que fiz ao Rio de Janeiro com sua família (na verdade só me recordo da galinha preta de macumba que encontrei numa praia).

Essa historinha só serviu para entrar em outro assunto: trote. este pode ser por telefone, que nem a Fernanda fazia, mas há outros tipos. Nesse caso específico, tem o trote dos calouros, tradição supimpa repetida nas universidades do nosso Brasil varonil. Eu não queria entrar nesse assunto, mas me sinto tentada. Passei exatamente 33 minutos discutindo isso no telefone com o meu namorado, e antes estava acompanhando a discussão no blog da Lola, que você pode espiar aqui e aqui. 

O que o trote da Fernanda tem a ver com os trotes das Universidades? Os trotes da Fernanda tinham o intuito de lesar e humilhar terceiros. Os trotes das Universidades, a mesma coisa. Resumindo a história para quem não sabe: No trote da Agronomia desse ano, as calouras tiveram que chupar uma linguiça lambuzada no leite condensado. Para quem quiser ver, tem o vídeo no youtube (eu que não vou postar o link aqui!).  Não é uma cena que recomendo assistir enquanto está comendo.

A discussão que surgiu disso tudo é: 1º Trotes são humilhantes? 2º Esse trote específico foi machista? 3º E o livre arbítrio de quem quis participar, conta?

Antes de mais nada, quero deixar claro que as opiniões escritas aqui são minhas e não quero, de forma alguma, dizer que sou detentora da verdade absoluta ou coisa do gênero. Estou aberta ao diálogo desde que ele seja civilizado.

Se trotes são humilhantes, minha opinião é que sim, são. Independente de quem são as vítimas . Claro que há trotes solidários, como é de iniciativa de algumas universidades. Mas o trote de pintar os calouros, sujarem, rasparem suas cabeças e os mandarem pedir dinheiro no sinal é humilhante. Eu não gostaria de ficar lambuzada de lama, tinta, água de peixe e sem sapatos pedindo dinheiro num semáforo. Ainda mais fresca do jeito que sou. Eca! Chupar uma linguiça que passou por diversas bocas antes da minha muito menos.

Se o trote específico da agronomia foi machista, sim ele foi. Estava discutindo isso com o Fabricio, e ele me indagou se repreender mulheres simulando sexo oral não era moralista. Aí que entra a questão do contexto. O que tem de mais tem no sexo oral? O que tem de mais na mulher praticá-lo e exercer sua sexualidade livremente? Nada! Aliás, seria ótimo se pudéssemos ser verdadeiramente livres, sem ter a sociedade inteira nos vigiando e dizendo o que devemos fazer com nossas vaginas e bocas. A questão é: os veteranos de agronomia estavam propondo a liberação sexual feminina? Ao colocar uma linguiça lambuzada no leite condensado, enquanto gritavam para as calouras "Chupem até o ovo. Isso aeê, garganta profunda! Iiiiieeeeiiiiii! Uhhhhhhuuuuuu Sekiçu oral(adaptação minha)!!!" eles estavam dizendo para as mulheres serem livres? A única coisa que vi foi o contrário. O mero fato das pessoas fazerem do sexo oral uma piada e motivo de chacota, só mostra como a sociedade está desacostumada com a sexualidade feminina. Isso faz com que o moralismo não esteja mais presente no discurso das pessoas que não concordaram com o ato (feministas ou não), mas sim no discurso daquelas que entraram em alvoroço e repetiram zombarias ao se depararem com tal simulação. No vídeo disponível do youtube, um dos comentários diz o seguinte: "aiai essas meninas ainda fkaram na fila esperando a vez delas ,são troxas e ,são muito é safadas queriam mostra p/ meninos q sabem chupar aiai ..."

Isso prova que, mesmo as que fizeram por livre e espontânea vontade, aindas são tidas como "safadas". E não duvido nada que muitos dos que presenciaram o trote (não só alunos da agronomia, mas de outros cursos que ali estavam) também devem ter falado a mesma coisa. Afinal, mulher simulando sexo oral só pode ser vadia mesmo. O que querem afinal? Se você desaprova, você é uma chata. Se você aprova, você é uma puta. E vâmo que vâmo! Fico com a opinião de que se a sexualidade feminina fosse vista com naturalidade, ela não seria usada em um trote.

Nisso passamos pela ponte JK e chegamos a outra questão, a do livre arbítrio. Eu não estava lá e não posso dizer se elas foram forçadas ou não a chupar linguiça, apesar de não duvidar da grande pressão para as mesmas fazerem isso. Como algumas pessoas já pontuaram, muitos aceitam passar pelo trote pela pressão do momento, e por acreditarem que dessa forma estariam se enturmando com os veteranos descoladex do curso. Há também a questão do "vou passar por essa humilhação agora, mas semestre que vem sou eu que estarei dando trote nos outros" e assim a tradição se conserva. O negócio é, foram as próprias alunas do curso que denunciaram o trote à secretaria de política para as mulheres. Não sei quem denunciou ou quantas foram, mas o simples fato de algumas terem se incomodado, é sinal de que a brincadeira não foi tão bem aceita assim.

Porém (há sempre um porém) não posso dar uma de feminista-bem-informada-e-resolvida e tentar salvar as pobres-mulheres-não-feministas-e-desinformadas-da-própria-condição, que coitadas, o que seria delas sem mim? Se algumas outras calouras já disseram que participaram porque quiseram e que não se sentiram humilhadas, o que posso fazer? Tratá-las como seres incapazes de pensar por si mesmas me colocaria na mesma posição que os misóginos. Com isso eu estaria desqualificando-as e reduzindo-as e não farei isso. Contudo a discussão é importante, os questionamentos também, e isso não me impede de vomitar para qualquer trote ou outra espécie de humilhação que eu julgar conveniente. Isso serve para abrir o debate: Porque trotes ainda são praticados e o que tem de legal neles? Porque gritar zombarias enquanto uma mulher simula sexo oral é machista? Até onde vai o livre arbítrio das pessoas? Elas são verdadeiramente livres? O que é ser livre afinal, cara-pálida?

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011



Olha só amor, aquela foto que você tirou do cigarro bailarino realmente ficou com formato de coração!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Ele era meu colega de colégio, riquinho, burro e crente. Era um verdadeiro idiota, juro. Vivia de topete se enturmando com todos, forçava amizade, por anos forçou comigo, e fazia o favor de me acompanhar todos os dias no ônibus. Infelizmente pegávamos a mesma linha. Infelizmente o aguentei durante todo o ensino médio e parte do ensino fundamental. Felizmente ao terminar o colégio, perdemos contato.

Um dia ele arrumou uma namorada. E vivia mostrando a foto dela para todos, e as cartas de amor trocadas também, cheias de erros gramaticais. E dizia que ela era rica, que o sogro tinha uma casa em cada capital brasileira, e que eles iam à Europa todo ano. A mentira era tão absurda que acho que nem o Eike Batista tem uma casa em cada capital. Começamos a desconfiar.

Ele fez um churrasco em comemoração a sabe-se lá o que. Eu fui, meus amigos foram, e não tinha cerveja no churrasco crente. E Diante do Trono ficou tocando durante horas. E o churrasco estava completamente boring. A namorada dele, ryca e phyna estava lá. A menina era um amor. A menina era boa demais para ele. A menina estava chamando a empregada da casa de mãe. A empregada da casa ERA a mãe da menina.

Ele tinha vergonha da condição social da namorada, mas eu - e todos os outros - enxergavam mais motivos para ela ter vergonha dele do que o contrário. Ela era boa demais para ele. Ela era inteligente e bonita, e ele era burro e feio. O deixamos ciente disso.

Meses depois ele levou um pé na bunda. Bem merecido, diga-se de passagem.

sábado, 8 de janeiro de 2011

(Ao som de Bach pq é esse que traduz).

- Fiz um curso de memorização, e lá aprendi que é bom estudar ouvindo Bach - disse minha colega de trabalho.

Sabem o que eu fiz? Hoje comecei a estudar ouvindo Bach, mesmo que meu namorado tenha falado que não tem nada a ver. Não sei se funciona, mas eu gosto de Bach. Ao mesmo passo que não ajuda, também não atrapalha. Fora que é ao som de Bach que as recordações vem à tona. Claro, o capítulo do Ginzburg ajuda mais ainda.

Um pouco mais cedo entrei no messenger, e minha bff (dando uma de miguxa que assiste, sei lá, Sex and the City) que está fazendo Mestrado em Portugal veio falar comigo. O diálogo foi mais ou menos esse: 

Carol'sss: E aí, como você está?
Uéslian Roriz - Eu quero defender toda aquela corrupção: uma pilha de nervos
insegura tb
prova pro mestrado semana que vem :(
Carol'sss: sério???
Uéslian Roriz - Eu quero defender toda aquela corrupção: sério
Carol'sss: você vai se sair bem
relaxa
relaxa mesmo
você sempre foi boa no que fez

Todos já me diziam que eu me sairia bem, que sou inteligente, que não era para eu me preocupar, porém foi somente com as palavras de Carol que me toquei. E não foi um me tocar do tipo "uhuuu já estou dentro do mestrado!" e sim um que, apesar de estar consciente das chances de não passar (o que sempre estive), também me deixa consciente das chances de conseguir, o que realmente me estava faltando. Foi a frase "você sempre foi boa no que fez" que me despertou para o princípio básico de que temos sempre 50% de chances de acertar e 50% de chances de errar, e se é isso que sei fazer (e que quero continuar fazendo), tenho que dar a cara à tapa. Como já disse minha tia: "Só erra quem tenta". 

Esperemos.





"Nenhuma luta haverá jamais de me embrutecer, nenhum cotidiano será tão pesado a ponto de me esmagar, nenhuma carga me fará baixar a cabeça. Quero ser diferente, eu sou, e se não for, me farei." (Caio Fernando Abreu)

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011


Minha amiga Flor chegou do Ceará e além de um porta moedas lindo e uma cocada, também me trouxe esse presente acima que eu adorei! Isso mesmo, é literatura de cordel sobre a Lei Maria da Penha, de autoria do Tião Simpatia (que não só é repentista, como também é cantor, compositor e educador).

Apesar de todas as falhas e do machismo da sociedade brasileira (inclusive dos profissionais das delegacias, justiça, etc), que impede que a lei seja aplicada de forma plena, a proposta da lei Maria da Penha é mais do que válida. Foi uma conquista da Justiça brasileira (e nossa, mulheres!) ter um dispositivo como ela. 

Fora que literatura de Cordel me fascina. Na verdade tudo o que pode ser concebido como cultura popular me leva ao delírio. 

Sem maiores delongas, aqui vão alguns trechos: 

I

A Lei Maria da Penha
Está em pleno vigor
Não veio pr'a prender homem
Mas pr'a punir agressor
Pois em "mulher não se bate
Nem mesmo com uma flor"

II

A Violência Doméstica
Tem sido uma grande vilã
Por ser contra a violência
Desta Lei me tornei fã. 
Pr'a que a mulher de hoje 
Não seja vítima amanhã

XXXII 

Espero ter sido útil 
Neste cordel que criei 
Para informar ao povo 
Sobre a importância da Lei 
Quem agride uma Rainha 
Não merece ser um Rei.

Eu achei show! Obrigada Flor!

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A foto da "capa" do blog foi tirada por mim, em minha casa no mato no interior do Goiás. 

Vou contar um segredo: Tenho medo de qualquer coisa alada. Tenho medo de passarinhos, borboletas, mariposas e outros animais voadores. Quando um pássaro voa em minha direção, entro em pânico, grito, faço escândalo.

Aí a mariposa apareceu em nossa casa e as crianças entraram em euforia. Fabricio, como bom biólogo, foi dar o seu parecer. Sem medo algum pegou a mariposa nas mãos e ficou "brincando" com ela. As crianças não tiveram medo de se aproximar, e quando vi já estavam fazendo carinho na mariposa também. Que vergonha, meu sobrinho de dois anos não teve medo de tocar na mariposa, enquanto eu só ficava olhando de certa distância. 

Mas confesso que a cena estava realmente bonita. A cena do meu namorado cercado de crianças, com a mariposa voando ao redor dele, me transformou em uma namorada babona. Ela saía de sua mão e pousava em seu ombro, seu braço, sua orelha. Pelo visto a mariposa achou o Fabricio irresistível. Partilho da sua opinião, o acho irresistível também.

O momento tão bonito me fez esquecer, por alguns minutos, que eu tinha medo. A vontade de fotografar o meu namorado e as crianças com o bichinho era maior do que o medo. Nem me dei conta que lá para as tantas, eu já estava entre eles também (mas claro, sem tocar na mariposa).

Aqui estão algumas fotos: 




O que ela quer de mim é coragem, já disse o João. E eu faço de conta que sou corajosa. Mas faço tão bonito, que ela até acredita. ("Pequena" Cristiana Guerra)

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Faltam quatro páginas de Jacques Revel e umas doze de Roger Chartier. Se conseguirei terminar? Sim, conseguirei. Eu sempre consigo terminhar uma resenha, ou duas, ou três. O Ringo dorme na cama. Hoje entrei em contato com três seres humanos: a Bel, minha mãe e meu namorado, mas hoje sou toda do Ringo, respiro o Ringo, Ringo é minha rinite sentimental.

Tento procurar inspiração para inscrever um texto. Procuro qualquer vestígio de sentimento. Tenho sentimentos, eles afloram, mas não consigo escrevê-los. Acho que ligarei para alguém perto da meia noite.

Eu quero entrar no mestrado, é só o que consigo pensar. Me penalizo a cada hora que não estou estudando. Estou me penalizando agora.

O último filme que vi era sobre uma bailarina que insandecia. Consegui assisti-lo inteiro e sem legenda, pontos para mim. A última vez que escrevi um texto foi sobre a TFP. Há quanto tempo não escrevo algo sem qualquer pretensão social, intelectual ou militante? Hoje cansei de ser militante. Queria só sentir, e talvez descrever sobre as sensações.

Eu sinto fome e tenho preguiça de cozinhar. Quero uma coca-cola. Não, não é sobre esse tipo de sensação que eu deveria escrever. Eu quero romance, mas já tenho, já o vivo, porque escrever sobre ele? Poderia escrever sobre amores inventados, mas estes foram superados e enterrados, bem no fundo do quintal. Eu sinto a necessidade de ser eu mesma, mas quem diabos eu sou? Eu sinto a necessidade de me sentir (não estou falando de masturbação, ô machinho do piupiu duro!). Sabe, de me encontrar e me reconhecer. Não me reconheço. Sou uma prostituta acadêmica que talvez esteja em seu ensaio de morrer para a vida. Talvez...

Vou largar a especialização, aconteça o que acontecer. Vou entrar na UnB nem que seja como aluna especial. Serei devorada por todos os cérebros infinitamente superiores ao meu, para um dia ter um cérebro superior também, e quando eu envelhecer não pintarei os cabelos. Não precisarei de vaidade, não precisarei de dinheiro, não precisarei de nada. Somente de uns livros velhos.
Ó galera, estou morrendo.
 
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